carta a um coração perfeccionista.

Você não é Deus. Você não é Deus! Você não é Deus.

Que alívio, não? O peso do mundo inteiro não depende das suas forças. Nada do que você faz precisa ser perfeito para funcionar.

Ter começado essa carta assim parece inadequado, afinal não é assim que cartas deveriam começar. Mas eu sentia que precisava desengasgar essas palavras presas na garganta.

Desde sempre fomos assim, coração. Nos cobramos demais como se fôssemos imbatíveis, enquanto lá no íntimo nos consideramos os mais incapazes do universo, mesmo para as atividades mais simples. Dois extremos que apontam para aquele nosso velho pecado: orgulho.

Por causa desse orgulho, queremos abraçar o mundo com as duas mãos, agarrando com as unhas a esperança de que será possível; mas não deixamos ninguém saber de nosso desespero, afinal somos terríveis em pedir ajuda e em admitir fraqueza. E quando a montanha de atribuições nos encara sozinhos, o orgulho nos acerta em cheio com o fantasma do perfeccionismo.

Queremos ser os melhores em tudo. Sempre a melhor filha, a melhor amiga, a melhor estudante, a melhor professora, a melhor profissional, a melhor voluntária e a melhor cristã. No fim, nada disso em nenhuma área.

E então o orgulho se transforma em ressentimento e insatisfação. O falso arrependimento bate forte, junto com o pensamento equivocado de que, se não for para ser perfeito, é melhor que nem seja feito.

E o ciclo se repete mais uma vez:

01) Assumimos diversas responsabilidades;

02) Nos agarramos a esperanças vazias depositadas em nossa própria força;

03) Escondemos nossos receios;

04) Nos aliamos ao fantasma do perfeccionismo (“se eu não posso vencê-lo, uno minhas forças a ele”);

05) Nos deparamos com nossa finitude;

06) Nos frustramos;

07) Prometemos - em vão - que nunca mais assumiremos um trabalho em que não podemos dar “o nosso melhor”.

Mas chega, coração. Chega de querer ser Deus.

O Senhor consegue carregar todo o peso do mundo, e d'Ele depende o universo. Ele consegue desempenhar com perfeita maestria diversas atribuições simultaneamente, sem vacilar em nenhuma delas.

Ele é tudo o que nós não somos. Ele é tudo o que nós desejávamos ser. Ele é perfeito, e nós somos perfeccionistas – seria este um eufemismo contemporâneo para "orgulhosos"?

É n’Ele em quem devemos depositar nossas esperanças; para Ele que devemos nos empenhar com intencionalidade; e a Ele que devemos recorrer quando formos tentados pelo pecado de orgulho. Dessa forma, d’Ele será a glória pelo nosso bom trabalho. Afinal, é isso o que Ele deseja de nossa parte: fidelidade em entregar um bom trabalho, jamais perfeição.

Por isso, coração, desista de tentar ser perfeito. Todas as vezes em que nós insistimos, o resultado é a estafa causada pela frustração. Nós sempre nos encontramos parados e estagnados, recolhendo os cacos que se espalharam pelo caminho.

Coloque sua esperança no Senhor, e dependa d’Ele em cada atribuição que estiver sobre sua responsabilidade. Abra mão da ilusão de entregar perfeição, mas empenhe-se em dar o seu melhor (que não será perfeito enquanto ainda estiver nesse lado da eternidade).

Não se esconda atrás do vitimismo e murmuração pela falta de capacidade. Lembre à sua alma que Aquele que habita em você, lhe concede todas as condições necessárias para ser abundante naquilo em que faz. E por isso, é unicamente n’Ele em quem você deve confiar. Afinal...

Deus consegue carregar o peso do mundo inteiro – e você não é Ele.

Deus consegue administrar inúmeras atribuições simultaneamente – e você não é Ele.

Deus consegue ser perfeito em tudo o que é e faz – e você não é Ele.

Deus jamais erra – e você não é Ele.

Deus não se atrasa e nem retarda as Suas obras – e você não é Ele.

Deus não depende de nada e nem ninguém para ser quem é e fazer o que faz – e você não é Ele.

Ao invés de investir (em vão) suas (poucas) forças em assumir a posição d’Ele, que tal assumir a sua própria, e passar a depositar a esperança em quem Ele é, depender das forças d’Ele, suplicar por Sua ajuda, e dedicar todas as suas obras Àquele que nunca lhe cobrou perfeição, mas sempre lhe concedeu todas as condições necessárias para um serviço abundante?

“Portanto, meus amados irmãos, sede firmes e constantes, sempre abundantes na obra do Senhor, sabendo que o vosso trabalho não é vão no Senhor.” (1Co 15:58)

“E Deus é poderoso para fazer abundar em vós toda a graça, a fim de que tendo sempre, em tudo, toda a suficiência, abundeis em toda a boa obra.” (2Co 9:2)

“Toda a boa dádiva e todo o dom perfeito vem do alto, descendo do Pai das luzes, em quem não há mudança nem sombra de variação.” (Tiago 1:17)

Se renda ao Senhor, coração. Apenas o Seu perfeito amor poderá pôr fim ao medo que lhe assola. Medo de não ser bom o suficiente; medo de não dar conta; medo de não ser perfeito.

Espero que daqui para frente nós encontremos n'Ele as condições para exercer toda boa obra em abundância, mas ainda não em perfeição.